Com a mudança na legislação trabalhista que começou a valer em novembro de 2017, a indenização por danos morais para as famílias dos trabalhadores vítimas do rompimento da barragem em Brumadinho ficará limitada a até 50 vezes o salário do funcionário da mina, limite para os danos gravíssimos, conforme o artigo 223-G, parágrafo 1º, item IV. Para a indenização por danos materiais, não há limite.
Segundo o advogado da Barbosa Mussnich Aragão (BMA) Luiz Marcelo Góis, o governo Michel Temer chegou a editar medida provisória que excluía acidentes de trabalho com morte do limite para indenização por dano moral:
- A MP da reforma excluía a limitação especificamente para acidente com morte e estabelecia que a indenização ficaria limitada a 50 vezes o teto do INSS (R$ 5.839), para evitar a falta de isonomia. Mas a MP caducou, pois o Congresso não chegou a votar a medida.
Durante a tramitação da reforma, algumas questões polêmicas, como a limitação e desigualdade nas indenizações e permissão para trabalho de grávidas em locais insalubres, poderiam mudar quando o projeto fosse enviado ao Senado. Para evitar que possíveis mudanças no Senado atrasassem a tramitação do projeto, já que seria obrigatório que a reforma voltasse para Câmara se houvesse modificações, o Planalto negociou que o Senado aprovaria o projeto como veio da Câmara, e o Executivo prepararia uma medida provisória que conteria as mudanças pleiteadas.
Mas, na votação da medida provisória na Câmara, o impasse se instalou e o governo desistiu da MP, abandonando a negociação, com medo de os parlamentares retomarem todas as regras mudadas no projeto. Foram mais de mil emendas à MP. Em abril do ano passado, ela caducou.
A nova lei também prevê que o limite pode ser dobrado se houver reincidência, mas se as mesmas partes estiverem presentes no novo evento:
- Tecnicamente, para caracterizar reincidência, é preciso ter as mesmas partes, mas vai depender da interpretação do juiz - afirma Góis.
No caso, as minas onde houve os acidentes foram diferentes - Mariana e Brumadinho - . mas o juiz pode entender que, como se tratou do mesmo tipo de acidente, envolvendo a mesma empresa, o valor da indenização tem que ser dobrado.
Essa limitação cria situação inusitada, as famílias dos trabalhadores podem receber indenização menor que as famílias dos moradores que foram vítimas do soterramento.
- Os familiares das vítimas da pousada, por exemplo, terão as indenizações calculadas pelo juiz, de acordo com a dor, já que não há relações de trabalho - afirmou o procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Curado Fleury.
Uma alternativa aos parentes dos trabalhadores é recorrer à Justiça comum. Mas, segundo Góis, é difícil que a Justiça comum considere julgar as ações de acidentes de trabalho:
_ A Justiça comum deve encaminhar para Justiça do Trabalho, pelas características do acidente, declarando-se incompetente para julgar os casos.
A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) entrou no início de janeiro no Supremo Tribunal Federal (STF) com ação direta de inconstitucionalidade, pedindo que os artigos que tratam de dano moral sejam considerados inconstitucionais. Segundo a entidade, a limitação contraria o princípio da isonomia, ao estabelecer indenizações maiores para quem ganha mais. Além disso, a associação afirma que a limitação tira poder dos juízes "ao impedir que o órgão judicante fixe em favor do trabalhador a indenização ampla eventualmente aplicável ao caso", diz a ação.
A Procuradoria Geral da República também ajuizou ação contra a limitação da justiça gratuita pelos trabalhadores.