Como se o desmatamento já não fosse suficientemente ruim, uma série de outras ameaças mata, num ritmo cada vez mais intenso, as árvores da Amazônia e de outras florestas tropicais úmidas da Terra. Uma revisão de artigos científicos feita por especialistas no tema, incluindo o pesquisador brasileiro Paulo Brando, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), e publicada na revista “New Phytologist” em fevereiro, indica que a taxa de mortalidade dessas árvores mostra sinais de aceleração nos últimos anos.
Os motivos são o aumento da temperatura, secas longas e piores, ventos mais fortes, incêndios mais extensos, mais cipós e até a abundância de gás carbônico na atmosfera – uma das causas do efeito estufa e elemento fundamental da fotossíntese. As mudanças climáticas estão ligadas a todos os problemas apontados. “O trabalho mostra que há indícios fortes que relacionam a mortalidade das árvores de florestas tropicais úmidas às alterações esperadas para essas regiões, em escalas global e regional”, afirma Brando.
O foco do estudo foram as florestas intactas, primárias ou antigas, na América do Sul, África e no Sudeste Asiático. A Amazônia brasileira aparece em destaque porque é o local mais estudado de todos. “Na Amazônia, todas essas causas de mortalidade de árvores estão presentes”, diz Brando. “Mas é difícil dizer que uma é mais relevante do que outra, porque todas têm um papel. Secas causam picos de mortalidade, enquanto o aumento de CO2 provoca mudanças de fundo. Já eventos de tempestades de vento impactam mais áreas fragmentadas, e o fogo causa muitos danos no sudeste da Amazônia.”
Equação letal
É impossível estabelecer qual desses ataques é pior. As secas têm se tornado cada vez mais longas e severas – na Amazônia, episódios anômalos ocorreram em 1997, 2005, 2010 e 2015. Como defesa imediata, as árvores tomam atitudes extremas, como fechar os estômatos (células por onde ocorre a respiração das plantas) e perder mais folhas. Essas folhas, por sua vez, se acumulam em abundância no solo e servem de combustível para incêndios florestais, que se alastram facilmente e por mais tempo.
Secas e temperaturas mais altas podem ainda levar as árvores a definhar de fome, também num mecanismo de defesa que acaba se tornando um algoz. Ao fecharem os estômatos para salvar água em seu interior, elas deixam de capturar o CO2 do ar, sua fonte de alimentação, enquanto consomem o que têm dentro. O regime forçado as deixa mais suscetíveis a ataques de pestes, como insetos, ou à competição por comida com os cipós – que, por sua vez, têm proliferado nesses ambientes. E, mesmo que a dieta não aconteça, o excesso de CO2 no ar também não significa que as florestas crescerão abundantemente.
“Quando há muito gás carbônico, algumas árvores podem dominar o pedaço e roubar os recursos dos vizinhos. Assim, há um aumento esperado na mortalidade de árvores, mas não necessariamente mudanças drásticas nos estoques de carbono”, afirma Brando. “Outra explicação é que a floresta se torna mais dinâmica com mais CO2; cresce e morre mais rapidamente, tanto pelo metabolismo quanto por mudanças na sua estrutura.” Tampouco o fato de estarem próximas à linha do equador traz vantagem para as florestas tropicais úmidas num planeta mais quente: um novo regime de temperatura, esperado para os próximos anos devido às mudanças climáticas, pode mudar o metabolismo das árvores.
Segundo Brando, reduzir a taxa de mudança no clima e estabilizar o processo o quanto antes, o que envolve tanto derrubar os níveis de emissão de CO2 quanto os do desmatamento, são fatores essenciais para manter as florestas tropicais. “Quanto menor a área de borda de floresta, comum em paisagens fragmentadas, menor o impacto de seca, fogo e ventos.” Ele ainda destaca a importância de aprofundar as análises: “Precisamos saber o que realmente está ocorrendo, para fechar buracos nas observações que ainda existem e nos preparar para os efeitos das mudanças climáticas”.