Critérios Para Avaliação do Ruído: Divergências Entre a NR 15 e a NHO 01
Editor: Sandro Azevedo
Postagem: 2019-07-27T12:00:17-03:00
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Mudanças a vista nos critérios da avaliação do ruído segundo a NR 15

Não é de agora que os leitores se deparam com artigos tratando das divergências entre os critérios técnicos e legais existentes sobre a avaliação do ruído ocupacional, dentre as mais comentadas sempre foram as divergências entre a NR 15 (MTE) e o INSS.

Recentemente nos deparamos com algumas divergências entre as Normas de Higiene Ocupacional da FUNDACENTRO e a NR 15, ambos os documentos, sob responsabilidade do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). Estas divergências são reconhecidas, até mesmo pela recém publicada NHO 01 da FUNDACENTRO que trata da Avaliação do Ruído Ocupacional.

Entendemos que estas divergências possam estar sinalizando para uma futura mudança na NR 15 – Anexos 1 e 2, que tratam da determinação dos limites de tolerância para Avaliação do Ruído. Caso contrário os profissionais de segurança que atuam no campo da Higiene Ocupacional terão que conviver com critérios diferentes que irão trazer grandes problemas na elaboração de laudos ambientais, periciais e laudos técnicos para o INSS visando a aposentadoria especial. A seguir faremos uma interpretação das recentes mudanças promovidas pela FUNDACENTRO.

A FUNDACENTRO e sua responsabilidade legal

freqüente o questionamento de muitos profissionais e até mesmo de alguns auditores fiscais do MTE sobre o aspecto legal que envolve a aplicação das Normas de Higiene Ocupacional da FUNDACENTRO como complemento aos critérios apresentados pela NR15.
No Brasil, principalmente na área de segurança do trabalho, os profissionais sempre esperam um posicionamento mais objetivo do MTE. Talvez uma Portaria explicitando a aplicabilidade das Normas da FUNDACENTRO seria importante, neste momento, para difundir a aplicação das normas NHO, não só relacionadas ao ruído mas também a outras relacionadas a saúde ocupacional.

A FUNDACENTRO é o braço técnico do Ministério do Trabalho com atribuições bastante definidas no campo da pesquisa e assessoramento técnico. Tem por finalidade principal a realização de estudos e pesquisas pertinentes aos problemas de segurança, higiene e medicina do trabalho, além de outros como descritos abaixo:

a)Pesquisar e analisar o meio ambiente do trabalho e do trabalhador, para a identificação das causas dos acidentes e das doenças no trabalho;
b) Realizar estudos, testes e pesquisas relacionados com a avaliação e o controle de medidas, métodos e de equipamentos de proteção coletiva e individual do trabalhador;
c) Desenvolver e executar programas de formação, aperfeiçoamento e especialização de mão-de-obra profissional, relacionados com as condições de trabalho nos aspectos de saúde, segurança, higiene e meio ambiente do trabalho e do trabalhador;
d) Apoiar tecnicamente os órgãos responsáveis pela política nacional de segurança, higiene e medicina do trabalho, bem como prestar orientação a órgãos públicos, entidades privadas e sindicais, tendo em vista o estabelecimento e a implantação de medidas preventivas e corretivas de segurança, higiene e medicina do trabalho;
e) Promover estudos que visem ao estabelecimento de padrões de eficiência e qualidade referentes às condições de saúde, segurança, higiene e meio ambiente do trabalho e do trabalhador.

Desta forma fica claro que as Normas de Higiene Ocupacional da FUNDACENTRO devam ser complementares e cuja aplicação deveria estar em total sinergia com a NR 15. Porém, na prática não é isto que se apresenta como veremos a seguir.

Divergências entre a NR 15 e as normas da FUNDACENTRO

Não há dúvidas que houve muita evolução nos conceitos que passaram desapercebidos na elaboração da NR 15 que teve como referência o princípio da exposição ao ruído Ocupacional; segundo os critérios da ACGIH de 1978. Diferenciando da NR apenas no limite máximo de exposição. Contudo a mesma ACGIH começou a admitir o princípio da energia de exposição onde considera-se o nível equivalente contínuo (Leq).

O que é o Leq e o TWA?

Os parâmetros, Leq e TWA não são sinônimos. O Leq, fisicamente falando, é a energia acústica a que o indivíduo está realmente exposto, onde a taxa de duplicidade (q) utilizada é igual a 3. Já o TWA é uma média ponderada no tempo dos níveis de pressão sonora, onde a taxa de duplicidade (q) varia de acordo com o critério da norma utilizada. No Brasil segundo a NR 15 este valor é igual a 5 dB, porém a NHO 01 determina que este valor seja igual a 3 dB, portanto, quando a taxa de duplicidade (q) é igual a três (3) o TWA (ou Lavg) é igual ao Leq.

O cálculo do Leq representa uma condição mais conservativa no que diz respeito à proteção do trabalhador. No Leq, a presença de níveis de ruído elevados, esporádicos, aumenta bastante seu valor, o que em alguns casos de mau uso do equipamento ou tentativa de modificação da realidade acústica do ambiente prejudica as avaliações.

Para se ter uma ideia clara do que estamos falando, imagine um indivíduo exposto a 80 dB(A) durante 60 minutos e a 110 durante 1 minuto devido a um problema esporádico devido ao rompimento de um cilindro. O Leq nesse caso específico seria de 92,5 dB(A) para um tempo de medição de 61 minutos.
Repetindo o exemplo feito anteriormente do Leq, o cálculo do TWA (ruído médio do ambiente) seria de 85,1 dB(A), isto é, um valor mais próximo do ruído habitual da atividade. No entanto fica clara a seguinte afirmação, se o ruído for contínuo ambos os valores serão iguais não importando a taxa de duplicidade utilizada; pois são valores médios.

Na opinião dos autores, deveria ser observado os dois valores para se concluir se houve adulteração dos resultados e até mesmo rastreadas as fontes de maior valor através de enquetes, também podem ser observados os Ln(s) que são os níveis estatísticos fornecidos pela maioria dos equipamentos. Portanto como o Leq é mais conservativo, achamos que este deveria ser utilizado pois preserva ainda mais a integridade do trabalhador.

Falando sobre a NR 15 e a NHO 01

Não estamos aqui para criticar a NR 15. O legislador assim entendeu que talvez não fosse a NR 15 o fórum adequado para aprofundar tais questões técnicas, relacionadas à metodologia e critério de avaliação e que acertadamente estão sendo apresentadas com maior profundidade pela FUNDACENTRO, mesmo porque, poderiam ser inclusive apresentadas através das normas técnicas ABNT ou por recomendações do próprio INMETRO.

O que está ocorrendo na conjuntura atual das normas e leis brasileiras é um desencontro de informações no que tange, a qual norma seguir e que parâmetros utilizar. Anteriormente, os profissionais da área de segurança do trabalho, através das normas NHT 07 e NHT 09 da FUNDACENTRO, obtinham o respaldo necessário para a realização de medições ocupacionais, que convergiam com as tabelas e cálculos da NR-15. Agora com as novas mudanças na NHO 01 criou-se uma situação polêmica. Os parâmetros de medição da NR 15 e da norma da FUNDACENTRO obedeciam a seguinte tabela:

80 16 h
85 8 h
90 4 h
95 2 h
100 1 h
105 30 min
110 15 min
115 7,5 min
Fonte NR 15 – Anexo 01 e NHT 09 – FUNDACENTRO

Atenção: Repare que nesse caso o tempo máximo de exposição cai a metade para cada incremento de 05 dB no NPS.

Analisando esta tabela, fica fácil entender o porquê da NR-9 estabelecer dose de 50% como nível de ação para a jornada de trabalho. Se fizermos uma simples regra de três, verificaremos que 50% para 8 horas de trabalho tem como resultado 80 dBA. Também concluímos que a única diferença que existia entre a antiga NHT 09 e a NR-15 era a consideração do nível de 80 dBA na composição da dose de exposição. Contudo, essa quase convergência entre a FUNDACENTRO e a NR-15 acaba de mudar. Com a recente publicação da NHO 01 (FUNDACENTRO) que trata em conjunto o ruído contínuo ou intermitente e ruído de impacto. A divergência passou a ser bastante significativa. A NHO 01 se utiliza do princípio da energia equivalente, isto é, leva em consideração para o cálculo da dose de exposição, o Leq que pode ser definido como o TWA (nível médio ponderado) para q = 3 dB, divergindo do critério estabelecido pela NR 15 que determina uma de taxa de duplicidade q=5 dB. Ao utilizarmos a taxa de troca q=3 iremos obter a seguinte tabela, presente na ACGIH e na NHO 01 da FUNDACENTRO:

80 25,40 h (*)
82 16 h
85 8 h
88 4 h
91 2 h
94 1 h
97 30 min
100 15 min
103 7,5 min
106 3,75 min
109 1,87 min
112 0,93 min
115 0,46 min
Fonte: ACGIH – NHO 01 – FUNDACENTRO

Atenção: Repare que nesse caso o tempo máximo de exposição cai a metade para cada incremento de 3 dB no NPS.

A NHO 01 especifica, também que os medidores integradores “de uso pessoal” (dosímetros) ou “portados pelo avaliador” devem ser ajustados para atender os seguintes parâmetros:

a) Circuito de ponderação – “A”;
b) Circuito de resposta – “lenta – slow” ou “rápida – fast”, quando especificado pelo fabricante;
c) Critério de referência – 85 dBA, que corresponde a Dose de 100% para uma exposição de 8h;
d) Nível limiar de detecção – 80 dBA;
e) Faixa de medição mínima – 80 a 115 dBA;
f) Incremento de duplicação de dose – q=3;
g) Indicação da ocorrência de níveis superiores a 115 dBA.

Evolução das normas de ruído e surgimento da NHO  01

No final de 1999 a FUNDACENTRO revisou as normas NH 061[1], NH 072[2] e NH 093[3] publicando a NHO 01. Esta nova norma consolidou alguns critérios técnicos previstos em normas internacionais como, por exemplo:
a) ANSI S 1.25 (1991) – Specification for personal noise dosimeters
b) ANSI S 1.4 (1983) – Specification for sound level meters
c) ANSI S1 1.40 (1984) – Specification for acoustical calibrators
d) IEC 804 (1985) – Integrating-averaging sound level meters
e) IEC 651 (1993) – Sound level Meters

Estes critérios técnicos dizem respeito a questões que no Brasil sempre foram polêmicas, talvez pela falta de divulgação das próprias normas da FUNDACENTRO em suas versões anteriores e pelo pouca divulgação de artigos técnicos sobre Ruído, especificamente sobre a importância da Higiene Ocupacional, estudos sobre dosimetria e do estudo de freqüência; bem como os conceitos técnicos envolvidos. Desde então muita coisa evoluiu, e esta evolução se deve principalmente aos esforços dos profissionais qualificados da FUNDACENTRO, que através da pesquisa vêm publicando normas técnicas relacionadas a Higiene Ocupacional de modo a estabelecer requisitos adicionais de como realizar os levantamentos ambientes, cujos limites de tolerância estão estabelecidos pela NR 15.

Desde a divulgação da NHT 06 – NHT 07 – NHT 09 publicadas a partir de 1985, a FUNDACENTRO vem tentando instruir os profissionais sobre a importância da dosimetria de ruído, e de alguns conceitos como por exemplo:

a) Incremento de duplicação de dose – (exchange rate – q);
b) Dose e dose projetada (D);
c) Nível equivalente (NC) – Equivalent level (Leq);
d) Critério de referência (CR) – Criterion level (CL);
e) Nível médio (NM) – Average level (Lavg) ou o conhecido TWA (Time Weight Average);
f) Nível limiar de detecção (NLI) – Threshold Level (TL).
1[1] NHT 06 R/E – 1985 – Norma para avaliação da exposição ocupacional ao ruído contínuo ou intermitente em fase experimental.
2[2] NHT 07 R/E – 1985 – Norma para avaliação da exposição ocupacional ao ruído – Ruído de Impacto 3[3] NHT 09 R/E – 1985 – Norma para avaliação da exposição ocupacional ao ruído contínuo ou intermitente através de dosímetros.

A NHO 01 fortalece o conceito do nível de ação apresentado na NR 9 com o aqueles cuja Dose seja maior que 50% (0,5). Está claro que os níveis de ruído acima de 80 dBA devam ser levados em consideração. Não há dúvidas que um levantamento de ruído com medidores integradores e dosímetros permitem maior exatidão dos resultados. Porém, todas estas dúvidas e questionamentos, levantavam inclusive a validade da dosimetria de ruído sob a alegação equivocada com relação a NR 15.

Todas estas questões desde a Lei 6.514 regulamentada pela Portaria 3.214/78 levaram a elaboração de laudos de ruído com medidores de leituras instantâneas acarretando relatórios equivocados e sem reprodutibilidade, e que, com certeza, comprometeram os resultados de muitas perícias judiciais de insalubridade.

Quadro comparativo entre a atual NHO  01 e a NR 15
Para Ruído Contínuo ou Intermitente:
- LT para 8 horas 85 85
- Incremento de duplicação de dose (q) 5 3
- Nível limiar de detecção (NLI) sem referência 80
- Nível Médio (NM) sem referência equação
- Valores abaixo de 80 dBA desprezíveis para efeito de cálculo de dose desprezíveis para efeito de cálculo de dose
- Nível de exposição sem referência equação
- Nível de exposição normalizado sem referência equação
- Nível de Ação referente (jornada de 8h)
- (NR 9 )80 dBA – Dose – 50% Nível de Exposição
- Normalizado 82 dBA
- Risco Grave e Iminente 115 dBA 115 dBA

Nota: É possível notar que com adoção do q=3 pela FUNDACENTRO o Nível de Ação passa a ser de 82 dBA para uma jornada de 8 h.

Para Ruído de Impacto:

- LT 120 dBC ou 130 dB (linear)
- 140 dB (linear)
- Relaciona número de picos máximos admissíveis em função do número de impactos
- Sem referência Tabela especifica
- Nível de Ação Sem referência (Np – 3) dB

Nota: A NHO 01 adota o critério do nível de ação para o ruído de impacto e altera o limite de tolerância em dB linear e não cita as alternativas na utilização de parâmetros em com leitura em dBC com circuito de resposta fast. Em complemento aos conflitos apresentados nas tabelas anteriores, a NHO determina que a avaliação de ruído em condições de trabalho que apresentam “dinâmica operacional complexa”, que exponham o trabalhador a diferentes intensidade de ruído, não poderão ser avaliados por métodos ou equipamentos que não seja com a utilização de um dosímetro. Podemos citar como por exemplo, entre outras atividades, a condução de empilhadeiras e de caminhões. Já a NR 15 trata da avaliação do ruído de forma genérica citando apenas que a mesma deva ser feita através de medidores de pressão sonora pois na época os equipamentos com circuito integrador (dosímetros) ainda era uma novidade e muito caros, o que inviabilizaria economicamente a realização de perícias e laudos ambientais realizados por pequenas empresas.

A própria NHO reconhece as divergências com a NR 15 – Anexo 2 e alerta que os parâmetros da FUNDACENTRO estão baseadas em conceitos e parâmetros técnico-científicos mais modernos o que fortalece a necessidade de uma revisão uma imediata de outras normas conflitantes, pois não é possível conviver com duas abordagens de avaliação e diferentes parâmetros de limites de tolerância.

Conclusão

Somos a favor das Normas da FUNDACENTRO de uma forma geral, pois esta entidade vem pesquisando e colocando novos conceitos e métodos de avaliação mais modernos que visam complementar a NR 15. Podemos destacar com este artigo alguns aspectos importantes aos leitores:

a) A FUNDACENTRO é órgão de governo ligado ao Ministério do Trabalho e Emprego responsável por pesquisar, definir os critérios de avaliação no campo da Higiene Ocupacional e elaborar normas;
b) As NHO tem amparo legal, pois são elaboradas por órgão técnico da SSST-MTE e deveriam ser utilizadas como referência de fiscalização pelos auditores fiscais do trabalho;
c) As NHO da FUNDACENTRO, devem estar em sinergia com a NR 15 e serem utilizadas como complemento de como realizar o monitoramento ambiental previsto na NR 9 e portanto não pode existir conflito de princípios e critérios;
d) A avaliação de ruído utilizando equipamentos integradores (dosímetros) é a forma mais adequada para se obter um laudo de ruído mais preciso e que o limiar de contagem de dose deve ser feita a partir de 80 dBA.

Desde a publicação da NHT 09 em 1985 a FUNDACENTRO deixa claro que a avaliação do ruído ocupacional através de dosímetros é mais precisa e permite um estudo de caráter mais preventivo ao trabalhador. Bem, vale lembrar aos leitores interessados, profissionais de segurança e até mesmo os auditores fiscais do trabalho que a NR 15 não sofre alterações desde a publicação da Portaria 3.214 em 1978. Porém, não podemos deixar de reconhecer os esforços da Secretaria de Segurança e Saúde do Trabalhador (SSST-MTE) e da própria FUNDACENTRO em atualizar alguns conceitos técnicos e legais. A própria redação da NR 9 (PPRA) é um exemplo, ao reconhecer a necessidade de estendermos nossa pesquisa a documentos mais atuais como por exemplo as normas internacionais ACGIH4[4] e normas ISO.

Fica claro, no entendimento dos autores, baseado nos argumentos anteriores, que não se pode abrir mão de garantir uma condição prevencionista favorável ao trabalhador, baseado em conceitos mais modernos, amparados em normas de reconhecida fé pública internacional, em detrimento de argumentos burocráticos enraizados em conceitos antigos que trazem pouco, ou nenhum, benefício à saúde do trabalhador.