Saúde e Segurança de Profissionais de Saúde no Atendimento a Pacientes no Contexto da COVID-19
Editor: Sandro Azevedo
Postagem: 2021-07-12T19:15:09-04:00
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A COVID-19, atinge os serviços de saúde impondo uma demanda extra de estruturas, insumos e recursos humanos, o que tem desafiado de maneira diferenciada os sistemas nacionais de saúde dos diversos países. O Brasil, onde historicamente o financiamento é insuficiente para garantir as condições para gerir as demandas cotidianas, está enfrentando sérias adversidades com o advento desta pandemia.

Os profissionais de saúde, grupo composto por distintas categorias profissionais, estão diretamente implicados no atendimento às pessoas infectadas pela COVID-19 e, por este motivo, compõem um grupo de risco específico para a infecção. A pandemia em curso expôs a fragilidade do setor de Saúde em garantir a segurança dos profissionais envolvidos no cuidado aos infectados. Trata-se de uma exposição que pode ser compreendida como “exposição biológica” e a maioria, se não todos os profissionais de saúde, estão expostos e possuem alto risco de adquirir a doença, particularmente ao realizar procedimentos em vias aéreas ou próximos a elas.

Este, sem dúvida, é um dos grandes desafios dessa pandemia: garantir a segurança e a proteção efetiva dos trabalhadores da saúde em um cenário de muitas dúvidas e poucas certezas, considerando-se o insuficiente conhecimento sobre as formas de tratar e controlar a doença e, principalmente, a sua alta transmissibilidade e velocidade de disseminação6.

Com a finalidade de ampliar o conhecimento disponível sobre a doença e compreender sua dinâmica de transmissão entre os profissionais de saúde expostos à COVID-19, várias instituições como a OMS, o Centers for Diseases Control and Prevention (CDC) e outras instituições e entidades têm disponibilizado diariamente informações, protocolos e recomendações atualizadas.

Diversos estudos nacionais e internacionais têm sido realizados para investigar a incidência e as repercussões da COVID-19 nos profissionais de saúde, bem como suas formas de transmissão. Organizar e sistematizar este conhecimento é fundamental para fornecer orientações aos gestores e demais tomadores de decisão no sentido de minimizar os riscos, fornecer equipamentos e insumos de proteção e reduzir os casos de afastamento de profissionais por contágio e/ou infecção por COVID-19.

Entre os profissionais que atuam em serviços não diretamente ligados ao atendimento de urgência para COVID-19, como serviços de saúde mental, um dos estudos analisados, realizado na China com 311 profissionais de psiquiatria (médicos e enfermeiros), identificou que 77,2% deles expressaram desejo de cuidar de pacientes psiquiátricos com a doença. No entanto, destacou que ainda falta treinamento para a assistência em saúde mental de doentes com COVID-19 e que o sentimento de medo é uma realidade entre essas equipes de saúde. Soma-se a isto o fato de que alguns profissionais de outras áreas, como urologistas, por exemplo, estão sendo deslocados de suas atividades usuais para atuar no cuidado a pacientes com COVID-19.

A necessidade de conhecimento profissional no campo da Higiene Ocupacional impõem-se como um dos principais fatores no enfrentamento do contexto de emergência, que exige a tomada de decisões baseadas em evidências fornecidas pela literatura científica disponível, por organismos nacionais e internacionais e pela observância das disposições legais. Nesse sentido, destaca-se a importância da circulação de orientações operacionais para todas as categorias envolvidas no serviço de saúde, com o objetivo de traduzir indicações gerais em procedimentos operacionais claros, a serem adotados nos locais de trabalho.

O desconhecimento sobre a doença tem sido apontado como uma das causas do aumento de contágio, inclusive entre os profissionais da saúde.

Trabalhar na linha de frente se mostrou um fator de risco para os sintomas de ansiedade, depressão, insônia, angústia e medo. A prevalência de ansiedade variou de 23% a 44,6% na equipe médica (médicos e enfermeiros). Ao comparar-se os sintomas de estresse psicológico entre equipe médica e estudantes de medicina, identificou-se que os profissionais são mais susceptíveis a essa condição.

A Síndrome de Burnout, condição de esgotamento físico e mental associada à vida profissional, mostrou-se menos prevalente entre os que atuam na linha de frente do atendimento a pacientes de COVID-19 se comparados aos profissionais que trabalham em outras enfermarias.

Estudos já mostram que a utilização de EPI pelos profissionais de saúde por si só não é suficiente para interromper a propagação da doença. São necessárias medidas adicionais que considerem outros fatores do ambiente de cuidado, por exemplo: triar os pacientes que se apresentam para atendimento (identificação do caso); colocar máscara e isolar rapidamente os doentes; reduzir o número de pessoas na sala de espera e de atendimento (distanciamento físico); avaliar o risco dos procedimentos a serem realizados; higienizar as mãos, limpar e desinfetar os ambientes de trabalho; gerenciar os resíduos hospitalares; usar tecnologias emergentes, como telemedicina hospitalar e aplicativos de compartilhamento de arquivos on-line, que podem facilitar o acompanhamento de pacientes nas consultas eletivas ou para outros problemas de saúde com menor gravidade.

Nas cirurgias de urgência e emergência, são recomendadas condutas como traçar planos objetivos e estabelecer critérios de classificação de risco de infecção, considerando a história médica, os sintomas clínicos, os exames laboratoriais dos pacientes e a adoção de protocolos de segurança, para selecionar materiais e/ou técnicas de proteção mais adequadas a cada caso, podendo ser adaptadas de acordo com a realidade de cada serviço. Em procedimentos respiratórios, é recomendável garantir o uso da sedação adequada para reduzir a emissão de gotículas e reduzir o número de profissionais expostos durante os procedimentos.

Além dessas medidas, foi destacada a necessidade de elaborar políticas direcionadas ao cuidado com os profissionais expostos a longas e exaustivas jornadas, como a criação de escalas de turnos coerentes para a atuação dos profissionais da saúde, permitindo descanso e realização de necessidades fisiológicas como alimentação e uso de sanitários, além do afastamento dos profissionais classificados como grupo de maior vulnerabilidade à infecção e das atividades de risco de contaminação.

No Brasil, as disparidades inter e intrarregionais e as políticas adotadas para o setor da saúde nos últimos anos fragilizaram o Sistema Único de Saúde (SUS). Com o surgimento da pandemia de COVID-19, as deficiências tornaram-se mais intensas e expostas, atingindo diretamente os 70% da população que depende dos serviços públicos de saúde e os profissionais que enfrentam condições de trabalho precárias e inadequadas em termos de atuação e de proteção individual.

As incertezas, a sobrecarga de trabalho e os riscos a que os profissionais estão expostos com a crescente demanda de pacientes infectados e que necessitam de cuidados hospitalares de enfermaria e de terapia intensiva afetam também a saúde mental desses trabalhadores. Esses impactos parecem ser especialmente mais intensos para as mulheres, que precisam conciliar sua dedicação e preocupações relativas ao trabalho com sua saúde, com a família e com os afazeres domésticos. O apoio social dispensado a elas pode interferir diretamente em sua qualidade de vida e saúde em geral. O suporte aos profissionais que têm filhos em idade escolar e/ou são do grupo de risco, por faixa etária ou outra condição clínica, é fundamental e pode ser decisivo para a continuidade de sua atividade laboral.

Mesmo com as repercussões negativas destacadas, é interessante mencionar que os profissionais de saúde acreditam que têm responsabilidade social e profissional com o atendimento dos pacientes e com a realização de jornadas estendidas. No entanto, isso se soma às preocupações com sua segurança e a de suas famílias, o que afeta a saúde mental, principalmente por presenciarem as mortes decorrentes da COVID-19. A adoção de diretrizes rígidas de controle de infecção, disponibilização e adequação de equipamentos especializados, aliados à valorização do trabalho, por parte dos gestores hospitalares e governamentais, e a concreta redução dos casos da doença podem proporcionar benefícios à saúde mental de toda a equipe.

Conclusão

Com a emergência sanitária em decorrência da pandemia causada pelo SARS-Cov-2, importantes questões de proteção e cuidados com a saúde dos trabalhadores estão surgindo.

É muito provável que a desigualdade observada na distribuição da produção científica pode vir a ser melhor gerenciada à medida que se acumulam experiências nos diferentes países sobre os impactos da doença entre os trabalhadores da saúde.

Fonte: Scielo Brasil